Problema intestinal de Bolsonaro pode estar relacionado com as cirurgias que ele realizou após sofrer a facada
A Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República confirmou que Jair Bolsonaro (sem partido) está com uma obstrução intestinal.
Ele foi transferido para São Paulo, onde deve passar por exames que determinarão a necessidade de uma cirurgia de emergência.
Na madrugada de quarta-feira (14/7), o presidente foi levado ao Hospital das Forças Armadas, em Brasília, após sentir fortes dores abdominais.
Ele já vinha apresentando problemas de saúde nas últimas semanas. No dia 9 de julho, Bolsonaro precisou deixar um jantar com empresários em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, ao passar mal.
O presidente também sofre de soluços constantes, que foram motivos de queixas em transmissões ao vivo, entrevistas e discursos.
Um primeiro comunicado, divulgado no final da manhã de quarta pelo ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, dizia que Bolsonaro estava bem e ficaria em observação pelos próximos dois dias.
Algumas horas depois, veio a notícia de que o quadro poderia ser mais sério: o cirurgião gástrico Antonio Luiz Macedo, que foi responsável por todas as intervenções e tratamentos após o atentado a faca sofrido por Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018, foi até Brasília e, numa avaliação mais aprofundada, diagnosticou a obstrução intestinal.
O médico orientou a transferência de seu paciente para São Paulo, onde serão realizados novos exames e eventualmente até uma cirurgia de emergência.
O que é obstrução intestinal?
Como o próprio nome já diz, essa condição está relacionada com o bloqueio de parte do intestino delgado ou do intestino grosso.
Essa obstrução impede a passagem de alimentos e enzimas digestivas que, ao longo dos intestinos, estão envolvidos em uma série de processos para extrair nutrientes e descartar aquilo que não será aproveitado pelo corpo, formando as fezes.
O gastroenterologista e cirurgião Flávio Quilici, professor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, explica que os intestinos têm uma estrutura parecida a de canos ou mangueiras.
"Se você pisar na mangueira ou entrar alguma pedra ali dentro, isso causa um entupimento que não deixa a água passar", diz.
O mesmo raciocínio se aplica ao nosso tubo digestivo: caso alguma coisa fique emperrada ali dentro, não há como o conteúdo transitar pelos órgãos e seguir adiante.
O que causa a obstrução intestinal?
Esse entupimento pode ser provocado por uma série de fatores, como doenças inflamatórias (caso de Crohn e diverticulite), tumores e até alimentos secos e duros (como sementes de jabuticaba, por exemplo).
No caso específico de Bolsonaro, os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil avaliam que o quadro está possivelmente relacionado às várias cirurgias que ele precisou passar após sofrer a facada em 2018.
De acordo com o médico Lúcio Lucas, chefe do centro cirúrgico do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, as operações no abdômen levam a um processo de cicatrização, que pode resultar na perda da movimentação do intestino.
"Para funcionar a contento, o tubo digestivo se mexe constantemente. E essa mobilidade pode ser prejudicada pela formação do processo cicatricial após os procedimentos cirúrgicos", contextualiza.
Um intestino mais "rígido" e com algumas estruturas cicatrizadas que grudam umas nas outras, portanto, pode sofrer uma espécie de torção, que obstrui parcialmente ou totalmente a passagem dos alimentos — é como se a mangueira do exemplo anterior se dobrasse por completo.
Vale ressaltar que essa é uma hipótese provável no caso do presidente, mas que ainda precisa ser confirmada pelos profissionais que o acompanham.
Quais os sintomas da obstrução intestinal?
Esse problema pode evoluir aos poucos e só dar sinais mais contundentes no momento em que está mais grave. Bolsonaro, aliás, sofria há pelo menos dez dias de uma crise constante de soluços.
"Os soluços são um sintoma da obstrução, especialmente quando ela acontece em algumas regiões do intestino delgado", observa Lucas.
Tudo indica que o quadro do presidente foi piorando até ficar insustentável, o que motivou a ida até o hospital em Brasília, avalia Quilici.
Essa condição também costuma estar relacionada com inchaço e dores fortes na barriga, sintomas que ele apresentou nas últimas horas, segundo boletins divulgados pelo governo federal na quarta-feira.
A obstrução pode ocorrer em qualquer parte do intestino
Quilici diz que é possível detectar a obstrução intestinal no exame físico, feito no próprio consultório, especialmente quando o paciente tem um histórico de cirurgias na região do abdômen.
"Podemos também fazer uma radiografia ou uma tomografia para encontrar essa obstrução", complementa.
Esses exames são de rotina quando um paciente é internado com os sintomas de Bolsonaro, segundo médicos ouvidos pela BBC News Brasil, e podem ser repetidos nas próximas horas em São Paulo para confirmar o diagnóstico e ter certeza da localização do problema, de acordo com as informações divulgadas na nota da Secom.
O que é feito após o diagnóstico?
Dependendo da causa, da gravidade e do local onde a obstrução ocorreu, o médico opta pelo tratamento conservador ou pela cirurgia.
Lucas explica que, nos casos menos graves, é possível recorrer ao jejum, a algumas medicações específicas e a determinados procedimentos menos invasivos, como a aspiração do líquido acumulado em razão do entupimento.
O paciente então é monitorado por um tempo, até que sua situação melhore.
Quando o bloqueio do tubo digestivo é maior, geralmente é preciso abrir a barriga para desfazer a obstrução ou remover a estrutura que bloqueia e aflige o intestino.
Quilici e Lucas concordam que a cirurgia é relativamente simples e não costuma estar relacionada a complicações ou a um pós-operatório muito difícil.
"Quando a operação consiste em apenas desfazer a dobra no intestino, a recuperação é rápida, e o quadro costuma evoluir muito bem", aponta Lucas.
"Agora, se o diagnóstico e a intervenção demoram muito a acontecer, há o risco de a região intestinal afetada sofrer uma necrose, o que exige a remoção desse pedaço", acrescenta Quilici.
Bolsonaro foi transferido para São Paulo e deve passar por exames e uma eventual cirurgia no Hospital Vila Nova Star, onde o cirurgião Luiz Antonio Macedo trabalha. BBC